domingo, 11 de novembro de 2007

rivka a segunda matriarca

Rivka, a segunda matriarca

Corajosa, decidida e generosa.

Estas são algumas características da personalidade de Rivka, esposa de Yitschak e segunda matriarca do povo judeu. Vinda de Aram, terra natal de Avharam, não hesitou em deixar seu lar e sua família para se casar com um homem desconhecido e viver em um lugar distante.

Movida por esta mesma coragem e inspirada pelo dom da profecia que, durante a difícil gravidez dos gêmeos Essav e Yaacov lhe revelara que “o mais jovem reinaria sobre o mais velho”, Rivka também não hesitou em interferir para que Yitschak abençoasse Yaacov no lugar de Essav, fazendo de seu filho menor o pai das Doze Tribos de Israel.

O destino de Rivka entrelaçou-se com o de Yitschak quando Avraham decidiu que era chegado o momento de seu filho se casar e dar continuidade a seu legado. Para isso, chamou Eliezer, seu mais fiel servo, e pediu-lhe que fizesse o seguinte juramento: “Quero que jures pelo Todo-Poderoso – Senhor dos céus e da terra – que não escolherás esposa para meu filho entre as filhas dos canaanitas, entre os quais me instalei. Nem escolherás uma dentre as filhas de Aner, Eshkol e Mamrai. Vai a terra onde nasci e escolhe uma esposa para Yitschak”. Avraham vivia então em Beer-sheva.

Mas, pergunta Eliezer: “E se a jovem não quiser voltar comigo, devo então levar teu filho de volta à terra que deixaste?” Gn 24: 5.

A resposta de Avraham não deixa dúvidas: “Não, meu filho, que foi escolhido como sacrifício ao Senhor no Monte Moriá, não deve deixar a Terra Santa. Meu Senhor, cuja mensagem divulguei em todo o mundo, mandará Seu anjo para ajudá-lo em sua missão. No entanto, se a jovem recusar-se a partir, estarás liberado de teu juramento e poderá escolher uma moça dentre as filhas de Aner, Eshkol ou Mamrai para meu filho. Mas, guarda-te de não levar meu filho de volta para lá”.

Por que Avraham estava tão preocupado com a origem da futura esposa de Yitschak e por que escolheu justamente Aram-Naharaim, a cidade de Nachor, seu irmão? Avraham sabia que uma mulher canaanita jamais poderia ser esposa de seu filho, pois um intransponível abismo espiritual e moral separava Avraham e seus descendentes do povo de Canaã. Ele optou por Aram porque sabia que o povo de sua terra natal não era moralmente corrupto como o de Canaã. No mais profundo de seu íntimo, Avraham desejava para seu filho uma mulher cuja retidão e compreensão de seu papel enquanto companheira e mãe fossem semelhantes às de Sara, sua amada esposa.

Eliezer encontra Rivka:

Segundo o Midrash, Eliezer jurou novamente lealdade a Avraham e iniciou os preparativos para partir rumo a Aram. Preparou dez camelos, que viajaram levando os presentes preciosos de seu mestre. Avraham deu-lhe também um documento no qual afirmava que todos os seus bens pertenciam a Yitschak. O Todo-Poderoso então mandou dois anjos para acompanhar Eliezer. Um tinha como missão escoltar o servo fiel e o outro, atrair no momento certo Rivka até o poço no qual Eliezer pararia para beber água.

Assim, relata o Midrash, com a ajuda de D’us através de Seu anjo, a viagem de Hebron a Aram, que normalmente duraria 17 dias, foi feita em apenas um dia.

A Torá nos relata como, ao chegar em Aram, Eliezer pede a ajuda Divina para encontrar a mulher certa para Yitschak: “Senhor, D’us do meu mestre Avraham, Seja misericordioso permitindo que eu cumpra minha missão ainda hoje. Eu permanecerei parado no poço esperando as jovens da cidade que costumam vir buscar água. Faça com que aquela que está destinada a Yitschak responda ao meu pedido para beber água, dizendo: ‘Beba e então eu darei de beber a seus camelos’. Pois aquela que tiver a bondade de oferecer água a mim e a meus animais, fará jus à bondade e hospitalidade que reinam na casa de Avraham”. Mal acabara de falar, surge Rivca.


Segundo o Midrash Rivka, filha de Betuel, não costumava ir à fonte para buscar água. Geralmente mandava suas servas, pois, além de modesta e recatada, seu pai era o rei de Aram-Naharaim. Mas o anjo enviado por D’us fez com que ela se dirigisse naquela tarde ao poço, ao encontro de seu destino – ser a esposa de Yitschak.


Parado no local, Eliezer observava as jovens. Queria ver a jovem destinada a ser a futura esposa de Yitschak longe da influência de sua família. Segundo o Midrash, quando Rivka chegou ao poço com um cântaro nos ombros, Eliezer imediatamente notou que ela não se abaixava para pegar a água, como as demais, mas esta brotava milagrosamente das profundezas em sua direção, indicando ser ela possuidora de uma especial santidade.

Dirigindo-se a ela, ele então perguntou: “Permita-me tomar apenas um gole da sua jarra?” E ela respondeu gentilmente, sorrindo, apesar de não o conhecer: “Beba quanto desejar, meu mestre” Gn: 24:18.

Depois que ele estava saciado, Rivka acrescentou: “Eu também darei de beber a seus camelos até que estejam satisfeitos”. Novamente ela se aproximou do poço e encheu a jarra para servir os animais, não apenas de um gole, mas em quantidade suficiente para que satisfizessem o estômago. É sabido que os camelos têm capacidade de armazenar água para vários dias. E Rivka os serviu dez vezes, observada por Eliezer. Além de extremamente linda, ela exalava bondade. Eliezer então teve certeza de que o Todo-Poderoso respondera a seu pedido: ele estava diante da jovem destinada a ser a esposa de Yitschak. Segundo alguns sábios, na época Rivka tinha apenas 3 anos de idade, enquanto outros acreditam que ela já tivesse 14 anos.


Eliezer então tirou de seu bolso um aro e duas pulseiras de ouro e a enfeitou, perguntando-lhe quem era seu pai e se havia em sua casa um quarto para hospedá-lo por uma noite. Dizendo ser filha de Betuel – filho de Milcá e de Nachor, irmão de Avraham – ela afirmou que havia abrigo para os camelos e também um quarto para hospedá-lo por quanto tempo ele quisesse. Agradecendo ao Todo-Poderoso por tê-lo feito encontrar a jovem adequada, Eliezer exclama: “Abençoado seja o Senhor, D’us de meu mestre Avraham, que me guiou diretamente para a família de meu mestre”.

Rivka correu para casa para contar à mãe o que havia acontecido, sendo ouvida por seu irmão Labão, que o convidou para sua casa. Eliezer, então, ao reunir-se com toda a família, falou de sua missão e de que maneira o Todo-Poderoso o conduzira até Rebeca. Tanto Labão quanto Betuel concordaram com o pedido de casamento, dizendo: “Isto é obra de D’us” Gn: 24:50. “A questão foi pré-determinada e não podemos impedi-la. Leve Rivka para ser a esposa do filho de seu mestre”. Ao ouvir a concordância de Labão e Betuel, Eliezer se prostou ao chão, para agradecer a D’us, e entregou a Rivka jóias e enfeites de ouro e prata como presentes de casamento.

No dia seguinte, Labão, irmão de Rivka, e a mãe tentam impedi-la de partir com Eliezer, argumentando que Rivka devia esperar um ano para preparar o enxoval e o casamento. Ao ver o anjo esperando por ele fora da casa, Eliezer afirmou que deveria partir imediatamente. A família então disse que a decisão cabia a Rivka. Mesmo sabendo que seu irmão e sua mãe não concordariam, a jovem afirmou: “Eu irei”. Assim, como Avraham, ela estava pronta para deixar sua família, sua terra natal para tornar-se esposa de Yitschak. Rivka desabrochara como “uma rosa entre espinhos”, entre pai e irmão corruptos. Apesar de serem ambos perversos; ela permaneceu pura e boa.

Rivka e Eliezer partiram de Aram ao meio-dia e chegaram a Beer-sheva na mesma tarde. Mais uma vez, segundo o Midrash, o Todo-Poderoso reduzira milagrosamente o tempo de viagem. Quando eles se aproximavam, Yitschak foi aos campos orar no local onde sentira a Presença Divina. Foi Yitschak quem instituiu o Minchá – a reza da tarde. Foi lá que Rivka o viu pela primeira vez, envolto pela luz da Presença Divina e, sobre ele, um anjo a protegê-lo. E disse: “Este deve ser um grande homem. Quem é?” Ao que Eliezer respondeu: “É o meu mestre”. Imediatamente Rivka agradeceu ao Senhor por ter sido destinada a ele. Segundo o Midrash, ao mesmo tempo, porém, teve a visão de que geraria um filho malvado (Essav), estremecendo e caindo do camelo. Eliezer a recolhe do chão e a leva a Avraham e Yitschak.

Casal único:

Com Yitschak e Rivka o texto bíblico relata o primeiro casamento que se conhece na história da humanidade. Foram o único casal monogâmico citado no Gênesis, pois, por ter sido “escolhido como sacrifício ao Senhor no Monte Moriá”, Yitschak não podia ter uma outra mulher também como esposa. Yitschak e Rivka se completavam e, como nos revela a Torá, amavam-se apesar das diferenças de personalidade. Yitschak era um pensador, um homem gentil e carinhoso, mas passivo. Rivka, ao contrário, um caráter decidido, de muita presença. Ambos possuíam visão profética, mas Rivka possuía também a intuição feminina.

O Midrash descreve Rivka entrando na tenda de Sara, a falecida mãe de seu futuro marido. Desde a morte de Sara, cada vez que Yitschak entrava na tenda e sentia a escuridão, entristecia-se. A luz que costumava emanar da tenda que fora de Sara permanecia apagada, restando apenas as trevas. Enquanto Sara viveu, as velas do Shabat permaneciam acesas, a farinha da chalá era abençoada e a Presença Divina pairava sobre sua tenda. Com a vinda de Rivka, seu casamento com Yitschak e sua entrada na tenda, as três bênçãos retornaram ao recinto.

Os gêmeos:

Rivka, assim como Sara, não conseguia engravidar. Passaram-se vinte anos antes que D’us atendesse as preces de Yitschak e Rivka, finalmente, conseguisse conceber. Sua gravidez foi difícil, pelos gêmeos que concebera. Durante os noves meses, ela sentia intenso conflito em seu ventre. Diz o Midrash que toda vez que ela passava por um idólatra, Essav dava-lhe pontapés e queria sair, enquanto que toda vez que passava por uma academia de estudo da Lei, era Yaacov quem se agitava em seu interior. A luta era tanta que, em sua dor, ela foi até a Academia de Shem e Ever para perguntar a D’us: “Se isto é assim, então por que eu existo?” E o Todo-Poderoso respondeu-lhe: “Há duas nações em seu ventre... o mais velho servirá ao mais jovem”.

Quando chegou a termo, Rivka deu à luz gêmeos; o primogênito foi chamado de Essav e o segundo de Yaacov. Os dois filhos de Yitschak e Rivka eram totalmente diferentes tanto fisicamente como moral e espiritualmente. Enquanto Essav era um caçador, Yaacov estudava.

Rivka sabia quem era Essav, realmente; via seus dois filhos em sua verdadeira natureza. Sabia que Essav era materialista, percebera sua dubiedade e sua brutalidade. Sabia que seu instinto para o mal era maior do que suas qualidades. Após ter vivido anos no meio de pessoas maldosas, Rivka sabia reconhecer a crueldade e a falsidade, enquanto que Yitschak, que passara sua vida no meio de santidade, pouco sabia sobre a maldade. Rivka via com clareza que somente Yaacov poderia mudar o mundo da forma como Avraham o concebera.

A bênção:

A Torá relata que “E foi quando Yitschak envelheceu e sua visão estava definhando, ele convocou seu filho mais velho, Essav...” Gn: 27:1.
Segundo um Midrash, seu problema na vista fora causado quando ele estava no altar de sacrifício no Monte Moriá, e o anjo interveio segurando a mão de seu pai. Neste momento, as lágrimas entraram em seus olhos, ali se alojando e enfraquecendo sua visão ao longo dos anos. Outro Midrash diz que, quando Yitschak estava para ser sacrificado, o Paraíso abriu-se e ele foi cegado pela luz da Presença Divina.

Yitschak sentira que havia chegado à hora de dar sua benção ao filho primogênito, por isso mandou Essav caçar e preparar uma refeição, para então abençoá-lo. Mas ao ouvir isto, Rivka que não esquecera a profecia de que “o mais velho servirá ao mais jovem”, decidiu agir. E, contrariando a vontade de Yitschak, interferiu para garantir a seu filho mais novo a bênção paterna que, de acordo com a tradição, seria concedida a Essav, o primogênito.

Rivka, certa do que fazia, insistiu para que Yaacov a ouvisse e seguisse de maneira exata as suas orientações. Prometeu que, se o seu plano falhasse, ela obedeceria aos desejos do marido. Mas o plano deu certo e Yaacov recebeu a bênção de Yitschak.

Segundo o Rambam, Yitschak não estava a par da profecia de que “o mais velho servirá ao mais jovem”, pois Rivka nunca a revelara a ele. Yitschak podia, segundo Rashi, estar ciente das limitações de Essav, mas acreditava que a bênção o melhoraria. Apesar de saber que Yaacov era o líder espiritual, o verdadeiro herdeiro do legado de Avraham, em seu íntimo, Yitschak sonhava com uma parceria, uma verdadeira comunhão entre os irmãos Essav e Yaacov. Esperava que Essav se dispusesse a prover alimento e sustento ao irmão, Yaacov, a quem cabia estudar e ensinar a Torá – e que, juntos, herdariam e transmitiriam o legado da vida judaica. Rivka, no entanto, com sua biná, intuição feminina, percebeu que a Essav não interessava a “parceria” com Yaacov. Interessava-lhe apenas usufruir sozinho de seu sucesso material. E que Yaacov seria o único a herdar e a transmitir o judaísmo.

Quando Yitschak se deu conta do que acontecera, estremeceu no fundo de sua alma. Porém, sabia que a bênção havia sido conferida com inspiração Divina e, assim sendo, era válida (Bereshit Rabá, 67). Rivka estava certa: Yaacov era o escolhido por D’us.

Quando Essav percebe o ocorrido, fica enfurecido e planeja matar o irmão. Mais uma vez a intuição de Rivka salva Yaacov. Ao perceber os planos de Essav, Rivka manda Yaacov para longe, para a casa de seu irmão Labão, onde devia permanecer até que Essav superasse sua raiva. Rivka temia o poder dessa raiva, temia pela vida de seus dois filhos. Por isso, mais uma vez, tomou uma decisão difícil; mandando seu filho Yaacov para longe.

Nunca mais Rivka viu Yaacov; ela morreu antes que ele voltasse para casa. A Torá não relata nada sobre a morte de Rivka, nossa segunda matriarca, só que está enterrada na gruta de Machpelá, ao lado de seu marido, Yitschak.

Bibliografia
• The Call of The Torah, An anthology of interpretation and commentary on the Five Books of Moses, Bereishis, Rabbi Elie Munk, Mesorah Publications
• A Torá Viva, anotado por Rabino Aryeh Kaplan, editora Maayanot.
• The Midrash Says – The Book of Beraishis
• Raver, Miki, Listen to Her Voice – Women of the Hebrew Bible

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