quarta-feira, 9 de janeiro de 2008

PARASHÁ SHEMOT ze n y

A parashá desta semana contém um forte indicativo da natureza profética do trabalho de Moshê. A Luz do Mundo Infinito indica a missão de Moshê diante do povo, retirar o povo Judeu da escravidão e humilhação do mundo finito (Olam HaZe), que é uma visão e percepção limitada da realidade e almejar a chegada a "Terra Prometida" (Olam HaBa = Consciência Ilimitada).

E tenho dito: Eu vos farei subir da aflição de Mitzraim para a terra do Cananeu e do Hiteu, do Amoreu e do Periseu, do Hiveu e do Jebuseu, para uma terra que emana de leite e mel. Shemot: 3:17

Quando o texto nos fala do "rei de Mitzraim" ele está se referindo ao "ego" e seus esforços robóticos na tentativa de nos manter preso às amarras da consciência finita. Para os cabalistas este é o maior agente aprisionador na natureza humana.

E Eu sei que não vos deixará o rei de Mitzraim ir nem mesmo com poder forte. Shemot: 3:19

Mais, Moshé nega por quatro vezes a missão que lhe é concedida, ao longo de seu diálogo com a Luz do Mundo Infinito. Cada vez que ele nega a natureza de seu preparo, está indicando que algo deve ser adquirido no exercício da experiência profética.

"Quem sou eu que irei ao Faraó?" Shemot: 3:11

É importante ter esta resposta – "quem é você" – para a realização de sua missão espiritual maior. Aqui envolve saber também qual é o papel que você ocupa dentro da existência. A descoberta do "ani", ou seja, o ser real que habita muitas vezes oculto dentro de nós.

"Qual é o seu Nome?" Shemot: 3:13

O conhecimento da força e da natureza espiritual do Nome de D’us é essencial no exercício do trabalho do cabalista. Aqui envolve igualmente o conhecimento dos elementos contemplativos que fazem parte da meditação e acesso aos níveis superiores da alma.

E respondeu Moshê, dizendo: E eles não crerão nem ouvirão a minha voz, pois dirão: Não apareceu a você o Eterno. Shemot: 4:1

A adesão a uma liderança espiritual está diretamente conectada a uma "visão", Moshê precisa ter uma visão da Luz para que o seu trabalho seja realizado com vitalidade. Para estarmos dentro do caminho espiritual é preciso buscar os elementos que possam nos indicar a adesão ao Mundo Infinito, isso passa inevitavelmente pelos elementos de adesão dentro do mundo físico. A "adesão" é um estado de submissão espiritual em que o discípulo busca estar totalmente submetido a uma linha de pensamento para desta forma buscar os elementos superiores de "adesão" com o Mundo Infinito.

E disse Moshê ao Eterno: Rogo, Senhor! Eu não sou um homem eloqüente nem de ontem, nem de anteontem, nem desde que falaste a teu servo; pois sou pesado de boca e pesado de língua. Shemot: 4:10

A idéia de ser pesado de boca indica que Moshê ainda possuía a sua palavra ligada aos níveis inferiores do mundo limitado, suas palavras ao serem pesadas estavam submetidas à força de gravidade que atua sobre tudo o que se liga ao mundo físico. Os antigos afirmam que a "lei da gravidade" é uma expressão (em Malchut) do desejo de receber para si mesmo. Sua palavra ainda estava inspirada pelos elementos da natureza física e era necessário buscar uma inspiração "do alto" para o exercício de sua missão espiritual. Para os cabalistas, não basta ter o conhecimento das palavras e do conteúdo elementar do conhecimento espiritual, é necessário estar sob a inspiração da Shechiná para poder falar os ensinamentos superiores. É isso que os antigos mestres contemplativos denominavam de unção do alto. Mesmo que se tenha o conhecimento das palavras, é necessário que elas sejam guiadas pela consciência superior e tenha não apenas uma conexão com a Verdade do Alto como também um poder transformador em si mesma.

E disse: “Jogue-a ao chão”, e jogou-a ao chão e se converteu em uma serpente, e fugiu Moshê de sua face. Shemot: 4:3
Aqui Moshê experimenta o poder espiritual que lhe é concedido por intermédio desta visão. Dominar Nachash (serpente), que é a força robótica e manipuladora do ego é parte de sua missão espiritual. O "galho" mencionado é a letra e "vav" e a sua associação com o Ruach dentre os níveis da alma. Reverter à ação nociva de Nachash (serpente) dentro de nós e transformá-la em forca espiritual é o que o cabalista consegue ao aplicar a restrição voluntária em sua vida.

E disse-lhe o Eterno, mais: “Leva por favor, a tua mão ao peito”. E levou a mão ao peito, e a tirou, e eis que a sua mão estava sarnenta como a neve. Shemot: 4:6

Moshê precisa reconhecer o aspecto frágil e superficial do corpo.

E será, caso não creiam também nestes dois sinais e não ouvirem a tua voz, tomarás das águas do Ieor e derramarás no seco; e as águas que tomarás do rio tornar-se-ão sangue no seco. Shemot: 4:9

Quando a Torá se refere a Ieor, os antigos associavam este nome ao Nilo, mais o termo usado aqui indica a idéia de "fluxo". O Ieor é a natureza do fluxo (shefá) que flui no mundo. A natureza de iniqüidade existente no mundo físico (seco) naquela época estava repleta de julgamento (sangue).

A natureza essencial desta parashá é nos indicar a natureza do tsadick (justo) e sua preparação para aquilo que veio a representar a maior revolução espiritual de todos os tempos. Segundo os sábios de nossa Tradição naquele tempo em Mitzraim (Egito), a força e inclinação negativa na humanidade haviam atingido proporções alarmantes. Mas por que a Luz do Mundo Infinito havia permitido que a humanidade chegasse neste estágio? Por que, de tempos em tempo, somos influenciados igualmente por uma massa crítica negativa? Através dos tempos o ser humano sempre tentou encontrar uma panacéia para todos os problemas, um meio, um método, uma fórmula para eliminarmos de uma vez por todas o sofrimento de toda a humanidade. Muitos, ao longo da história, sonharam com um mundo assim, mais para a perspectiva cabalista, o descobrimento de um meio que terminasse com o sofrimento humano resultaria em uma tragédia sem paralelo, pior que todas as guerras, que todas as catástrofes, que todas as epidemias e que todas as atrocidades juntas. Que razão teria um cabalista para pensar assim? Para os cabalistas isso produziria um prolongamento cruel de nosso tikun, que é o nosso processo de correção espiritual. Estamos aqui neste mundo para fazermos ajustes, correções e aprimoramentos e nossas constituições finitas e essas transformações se produzem por intermédio da resistência, o mal estar e o sofrimento. Este processo de correção é chamado de tikun. A alma se purifica por intermédio da resistência. Pensar em um tempo onde todas os obstáculos pudessem ser removidos seria como pensar em uma tragédia, pois isso apenas prolongaria a agonia da existência finita e deixaria toda a natureza espiritual do ser humano, congelada. Nossos Sábios nos ensinam que cada um de nós possui uma só aspiração verdadeira, que é regressar a Luz do Mundo Infinito e para isso temos que buscar um nível de adesão com os tzadickim (justos) de nossa Tradição. Um tzadick é um homem sagrado, uma pessoa de conhecimento. Moshê foi um tzadick, assim como Rav Akiva, Rav Avraham Abuláfia também compartilharam disto. Uma pessoa que almeja tornar-se um tzadick afasta totalmente o desejo de receber para si mesmo e resiste aos desejos do corpo, seguindo unicamente à vontade da alma. Tais pessoas se encontram tão completamente desprovidas do aspecto negativo do desejo que a natureza dos sentidos comuns é superada por uma percepção sensorial mais sensível (derivada da alma). Para isso, o tzadick pratica a restrição em cada oportunidade. Procura eliminar o estado de comodidade e complacência porque estas são inspirações do corpo, causadas pelo desejo de receber para si mesmo. É por isso que uma mente, pautada no desejo de receber para si mesmo, quando observa a vida de um tzadick pode erroneamente achar que o mesmo está sofrendo, quando nada poderia estar mais afastado da verdade. O tzadick, ao negar-se cair nas tramas da comodidade, se eleva acima do mundo físico das ilusões e das aparências exteriores, e se conecta a uma consciência superior que é ativada pelo aspecto positivo do desejo – o desejo de receber para compartilhar.

A resistência voluntária do tzadick causa o cancelamento do desejo de receber para si mesmo, que é a raiz de toda má ação e por isso ele é capaz de transcender o âmbito negativo. Ao transformar o desejo de receber para si mesmo em desejo de receber para compartilhar ele se eleva por cima do Olam Tohu (Consciência do Caos) que representa a realidade física ilusória que enfrentamos cotidianamente e se une com Olam Tikun (Consciência da Correção) que é a verdadeira realidade Infinita do Or Ein Soph (Luz do Mundo Infinito). Quando o tzadick consegue realizar esta operação em sua vida, ele consegue elevar igualmente toda a humanidade.

Por cima do estado inferior da consciência do corpo existe a verdadeira realidade Infinita e é nesta realidade que o tzadick permanece conectado a todo o tempo. O tzadick afasta o desejo de comodidade e complacência do corpo com o fim de satisfazer as diretrizes da alma que é muito mais importante.

O circuito espiritual requer a resistência voluntária. Ou restringimos e revelamos a Luz ou não restringimos e permanecemos na obscuridade. A menos que mediante sua resistência voluntária o homem vença o aspecto negativo do desejo, o propósito de sua existência nunca será revelado. Por isso, o cabalista deveria adotar uma atitude de resistência constante, pois ao fazer isso, ele dissipa a ilusão atrai a Luz para si e para a humanidade. Esse simples mecanismo tem a capacidade única de eliminar todas as ilusões de Olam Tohu.

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